Cartola – Música para os olhos
Repetindo o atraso do mercado fonográfico, que demorou meio século para reconhecer sua música, após quase 30 anos da morte do sambista Cartola o cinema reconhece o valor e a poesia de sua vida. O filme Cartola: Música para os olhos, do pernambucano Lírio Ferreira (Baile Perfumado, Árido Movie), é um documentário que utiliza o mestre da Mangueira como ponto de partida para contar a história do samba e da malandragem carioca no século XX.
No documentário, Lírio Ferreira foge da linguagem convencional e freqüentemente monótona do gênero. O diretor mescla imagens de arquivo, interpretações de músicas do mestre por nomes consagrados da música nacional intercaladas às próprias atuações improvisadas de Cartola, depoimentos de amigos próximos, seqüências de ficção e outros recursos que permitem narrar de forma instigante a vida do sambista e de seus parceiros.
O resultado é um filme leve, que pretende informar o espectador sem as amarras comuns a documentários tradicionais. Há muita informação no filme, mas o entretenimento e a musicalidade não foram relegados a segundo plano. E nem poderia ser diferente em um filme que trata da vida de um boêmio inveterado, símbolo da malandragem e da alegria carioca. Tal qual o sambista, o filme não obedece padrões pré-estabelecidos, mesclando imagens que se sucedem de acordo com a necessidade da narrativa, e não exigências históricas, documentais ou lineares.
Esse mosaico de linguagens presente no filme segue uma tendência atual. Utilizando os mesmos recursos, o diretor Miguel Faria Jr. filmou Vinícius, que trouxe para o cinema a tumultuada (no melhor sentido que essa palavra possa ter) vida do poeta Vinícius de Moraes e alcançou o feito de ser o documentário brasileiro mais visto de todos os tempos. Mas o filme de Lírio Ferreira consegue ser ainda mais ousado, ao utilizar experimentações de linguagens inovadoras, como o uso do fade out -ausência de imagens na tela- para simbolizar uma época em que não havia notícias sobre Cartola, a marcha (a ré) de militares simbolizando o retrocesso do país com o golpe de 1964 e a sobreposição de imagens da II Guerra Mundial e a cantora Carmen Miranda, contextualizando as diferentes décadas acompanhadas pelo filme.
Marcadores: Crítica Cartola
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